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quinta-feira, 7 de junho de 2012
Contra-sensos
Quando a gota se viu semelhante a uma gema valiosa, na
folhagem da primavera, insultou o rio em que se formara: Sai da
frente, monstro do chão.
Quando o tronco se agigantou diante do firmamento,
blasfemou contra a própria raiz: Não me sujem os pés.
Quando o vaso passou pela cerâmica em que nascera, gritou
revoltado: Não suporto essa lama.
Quando o ouro se ajustou ao palácio, indagou da terra que o
produzira: Que fazes aí, barro escuro?
Quando a seda brilhou, na pompa da festa, disse à lagarta que
lhe dera existência: Não te conheço, larva mesquinha.
Quando a pérola fulgiu, soberana, exigiu da ostra em que se
criara: Não te abeires de mim.
Quando o arco-íris se reconheceu admirado pelo pintor,
acusou o sol de que se fizera: Não me roubes a luz.
*
Copiando esses contra-sensos figurados da natureza, o
homem insensato, quando erguido ao pedestal do orgulho pelos
abusos da inteligência, costuma escarnecer de si próprio,
afirmando jactancioso: A vida é poeira e nada, e Deus é ilusão.
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