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domingo, 17 de junho de 2012

AULAS DA VIDA


 
AULAS DA VIDA

A casa repousava, além de zero hora,
Quando o juiz no leito ouviu certo rumor ao fundo.
Quem seria? Pensou, ansioso e expectante...
Talvez um assaltante...
Quem, no entanto ousaria
Penetrar-lhe a mansão construída no alto,
Com dois guardas, na ronda, de vigia?
A princípio, o ruído parecia
Um barulho tão leve, tão manso,
Que mais se assemelhava ao vento na folhagem,
Quando o palácio, à noite, era paz e descanso.
Mas o brando alarido aumentava de porte,
Justamente na alcova sempre reservada
Em que ele, o juiz, mantinha um cofre forte.
Armou-se à pressa e afastou-se da cama,
Pés descalços, andou no carpete, em pijamas
E pela porta além, levemente entreaberta, l
obrigou figura baixa e estranha
De um mascarado que se recobria
Numa capa sombria,
A furtar-lhe, no cofre escancarado,
Todo dinheiro ali depositado
Maneando lanterna diminuta,
O invasor ocupado nada escuta.
Mas o juiz entrando em fúria cega
Ergue o revolver, firme. Aponta e descarrega.
Toda a carga de bala no infeliz
Que tomba morto agora em pleno escuro.
Indeciso e nervoso, o magistrado
A erguer-se em defensor do próprio domicilio,
Liga a luz, sob a dor do gesto cometido,
E fita o mascarado
A encharcar-se de sangue...
Chama os guardas amigos de plantão,
Ativa o telefone e pede policiais
Que lhe arranquem do lar o assaltante caído,
Depois de se lavarem
Depoimentos, motas, testemunhos
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Para os efeitos justos e legais.
Efetuadas todas as medidas,
Um servente de mãos embrutecidas
Inspeciona o cadáver e, ao movê-lo,
Despe-lhe a capa enorme
E retirando a máscara de pano, vem ao juiz e informam desumano:
- É um menino, Excelência...Um ladrão nato
Devia ter no jeito a esperteza de um rato.
Na angustia enorme do seu próprio drama,
O magistrado exclama:
_ horríveis tempos ! Dias infelizes!...
Época de ladrões e meretrizes”...
Que possa resguardar uma simples criança...
Onde iremos, meu Deus? Meninos salteadores,
Crimes, violência, guerra e uma série de horrores!...
Nisso, quatro serventes se aproximam, carregam com cuidado o corpo inerte e triste,
Mas o juiz , ao vê-lo, não resiste;
Detém todo o cortejo em súbita parada, cai sobre o morto em pranto compulsivo,
Beija-lhe a face inerme e ensangüentada,
Como se o morto inda estivesse vivo
E bradou, em supremo desconforto:
- O que fiz, Grande Deus, para sofrer em minha própria casa,
Essa dor que me arrasa?
Matei para viver e estou aniquilado e morto:
Matei, mas nem de longe imaginava
Que abatia sem pena
O filho que adorava...
Deus, Grande Pai, dá-me de qualquer forma,
A expiação que me condena...
Lançava o sangue ao chão amplo e rubro rastilho
E o pobre prosseguia, em convulsões de dor:
- dá-me forças, meu Deus!...
Perdoa-me Senhor!...
O pequeno assaltante era o seu próprio filho.

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